quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Janela da espera



Naquela casa tão grande, aos meus olhos ingênuos, havia uma grande vidraça.
Era uma janela  muito grande. Talvez, a maior de todas até aquele dia.
Ali, eu passava boas horas de minhas tardes observando quem passava.  Via as trilhas de formigas invadindo a casa, carregando pedaços das pétalas das rosas plantadas pela minha avó.
Era um lugar especial e triste.  Dali, eu via o campo do grêmio, via os prédios altos do centro da cidade, imaginava descer de skate pela rampa do centro administrativo...
Via a cidade, percebia as chegadas e as partidas. Era um constate ir e vir. Quem saía, quase sempre voltava.
Ali do alto, muitas vezes minha torre, eu esperava.  Imaginava que qualquer dia ele apareceria de surpresa. Não precisava trazer nada. Só precisava chegar e ficar um pouco. 
Muitas vezes, eu sonhava essa cena de olhos abertos. Em silêncio porque aquele sentimento não cabia nas palavras que eu conhecia.
Não sabia o nome, mas sentia. Uma ou outra vez, o telefone tocava.  Domingo podia ser o dia... aí era um misto de alegria e de tristeza.  Eu me partia.  Ouvir aquele som estridente era sinal da distância.  Era a sina de quem não sabia como era conviver.  De quem nunca se acostumava em receber em retalhos.
Afeto não faltava.  Eu transbordava a presença de muitos. Tios, dindos e avôs que se empenhavam em oferecer a presença. O que é uma criança sem esse presente?
Como toda a história de ausência, há quem se desdobre para  as lacunas dos nãos.
Mãe que é em dobro e que não se cansou nunca de dar colo e enxugar o pranto da tristeza e da raiva. Raiva de não se sentir merecedora do amor. A vida foi. Foi generosa. Passos e estradas cruzadas. Tudo foi indo... sem, de fato, ser inteiro.
A janela da espera continua aberta. Ela não é mais infinitamente escancarada. Com o tempo, e por medo, foi necessário o uso de grades. Por receio, e por falta de intimidade, as cortinas chegaram.
A janela de tantas quimeras é  feita de esquecimentos e de lembranças. De saudades do que poderia ter sido. Será que faltou coragem?
A minha janela ainda guarda esperança de que um dia chegue, pode ser sem avisar, o perdão e outra chance para resgatar o que ficou lá.
E que de vez em quando volta em sonho, compreensão  e choro.

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